27 de dez. de 2008

Olha Marília...

Olha, Marília, as flautas dos pastores
Quem bem que soam, como estão cadentes!
Olha o Tejo a sorrir-se! Olha, não sentes
Os Zéfiros brincar por entre as flores?

Vê como ali, beijando-se, os Amores
Incitam nossos ósculos ardentes!
Ei-las de planta em planta as inocentes,
As vagas borboletas de mil cores!

Naquele arbusto o rouxinol suspira,
Ora nas folhas a abelhinha pára,
Ora nos ares suspirando gira:

Que alegre o campo! Que manhã tão clara!
Mas ah! Tudo o que vês, seu eu te não vira,
Mais tristeza que a morte me causara.
Manuel du Bocage

Um comentário:

  1. Bocage foi um dos primeiros a anunciar a modernidade em Portugal, pelos conflitos que dão força e contundência a seu estilo poético.
    Maior poeta da língua portuguesa no século XVIII, Bocage é vítima até hoje de sua própria fama e dos preconceitos que despertou.

    Sonetista admirável e frequentemente à altura de seu ídolo Camões, excede-o aqui e ali, no arrojo e no niilismo dos motivos.

    Esse soneto encantou a sensibilidade parnasiana do poeta Olavo Bilac.
    Nesse, Bocage segue o magistério clássico em tudo quanto este exprime a clara ordem exigida pela razão, o amor da beleza esplendor da Verdade: e se a poesia é, segundo Coleridge,'a melhor palavra colocada na melhor ordem', nenhuma poesia ultrapassa a do Poeta: ordem, brilho, nitidez, rigor expressivo, fluidez melódica.

    Nada no tempo se escreveu de mais perfeito, como ordenação frásica e fluência musical, do que este belíssimo quadro campestre.

    (do livro Sonetos de Manuel du Bocage)

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